sexta-feira, 27 de maio de 2011

ECONOMIA DE COMUNHÃO REALIZA ASSEMBLEIA INTERNACIONAL NO BRASIL

A Assembleia Internacional da Economia de Comunhão de 2011, realizada em Mariápolis Ginetta Calliari, no município de Vargem Grande Paulista, São Paulo, iniciou na manhã de 25 de maio de 2011, rememorando pessoas que contribuíram para a construção dessa economia, relembrando momentos difíceis, mas também momentos de conquistas. Na realidade foi uma celebração da caminhada da Economia de Comunhão (EdC), comemorando os seus 20 anos no Brasil.

O relato é de Lucas Henrique da Luz, professor e da equipe de coordenação do Curso de Administração da Unisinos.
Juntamente com e Gilberto Antônio Faggion, professor do Curso de Administração da Unisinos, ele participa deste evento. Lucas Henrique da Luz e Gilberto Antônio Faggion, também trabalham no Instituto Humanitas Unisinos - IHU.


Eis o relato.

Na parte da tarde houve a visita às empresas que localizam-se no Pólo Spartaco, que agrupa exclusivamente empreendimentos da EdC.
Nesse primeiro dia ressalta-se a dimensão do evento, o qual conta com mais de 600 participantes e com tradução simultânea para seis idiomas, quais sejam: coreano, português, espanhol, italiano, francês e inglês.

No segundo dia destaca-se a palestra intitulada “Qual a Antropologia para uma Economia de Comunhão”, proferida pela socióloga Vera Araújo. Ela evidenciou a antropologia que pode garantir a economia de comunhão, a fim de colocar a sociedade em comunhão, em partilha. Uma vez que na atualidade percebe-se que cada vez mais a individualidade e o egoísmo têm se tornado algo próprio, e esse pensamento invade dimensões econômicas, sociais e políticas.

Já a comunhão significa colocar no centro a pessoa humana, respeitando e fortalecendo suas duas dimensões: a identidade e a sociabilidade. Deve-se preservar o singular de cada um, mas saber que ele ocorre e se efetiva com e no outro. Viver a comunhão não é uma escolha, mas sim uma necessidade. Mas, como viver assim em uma sociedade que parece preparada para a individualidade?

Para Vera, a criatividade pode e deve ser usada nesse sentido, aplicando questões como a comunhão na diversidade étnica, no pluralismo religioso, com um diálogo aberto e respeito à diferença, buscando juntos as verdades. Por exemplo, o pluralismo político pode passar da discussão dos assuntos e das divergências à síntese do bem comum. Já as pobrezas material e cultural podem suscitar um momento de comunhão e de partilha.

A socióloga ressalta que a comunhão deve ser verdadeira e não apenas formal. Ela se dá com pessoas e não com funções ou objetos e tem diferentes complexidades. Por exemplo, é diferente a comunhão que se tem com a família, da que se tem com um colega de trabalho.

Para quem tem fé essa comunhão nasce na própria trindade, que é o reflexo de Deus em três pessoas. Conforme a encíclica de João Paulo II, a consciência da paternidade comum de Deus, da fraternidade de todos os homens em Jesus Cristo, da espiritualidade e da fraternidade da humanidade no Espírito Santo, fazem com que possamos pensar, à luz da fé, em um novo modelo de generosidade e comunhão humana, de unidade humana, como um reflexo da vida íntima de Deus em nós. Isso é a comunhão e deve guiar nosso ser e agir, inclusive na economia.

Chiara Lubich dizia que esse modelo de comunhão trinitária não é abstrato e deve ser concretizado entre os homens. Deve-se buscar a unidade, sendo em um todos nós, encontrando no um a distinção, como Deus que sendo amor é uno e é trino.
Para chegar a esse alto grau de convivência é necessário cultivar o relacionamento, desenvolvendo nossas capacidades relacionais; compreender a essência do relacionamento humano, podendo atuá-lo na vida e inseri-lo nos projetos econômicos e sociais.

Vera afirma que se exige cada vez mais uma cultura da relação, pois esta é capaz de enfrentar as adversidades e os desafios da nossa época. O relacionamento é cada vez mais necessário, significativo e verdadeiro e tem no amor, um dos seus elementos, sem querer fazer disso somente um discurso religioso. Várias pessoas que não são religiosas indicam o amor como um elemento fundamental do relacionamento. A palestrante diz que: “Diante de tudo o que ocorrer no futuro, sei que aprendi três coisas que ficarão para sempre gravadas: a vida, inclusive a mais dura, é o bem mais precioso e milagroso do mundo; segundo, o cumprimento do próprio dever é que faz a nossa vida ser feliz; e terceiro, a crueldade, o ódio e a injustiça jamais poderão gerar o renascimento da vida, da felicidade. Só o amor pode fazer isso.”

É com amor que devemos nutrir os nossos relacionamentos para chegar à comunhão. Essa arte de amar foi desenvolvida por Chiara Lubich pelo seu próprio testemunho de vida. E isso requer alguns princípios, iniciando pelo amar a todos, tendo em vista que o amor verdadeiro é universal, sem nenhum tipo de exclusão. Todos devem ser incluídos no circuito do amor.

Segundo, ser o primeiro a amar, tomar a iniciativa no amar, repassando obstáculos e acender uma chama para o amor, com coragem, superando o pudor do individualismo. Começar é uma atitude-chave na aproximação, no processo do amor.
Amar a todos e ser o primeiro a amar, era uma pregação constante de Chiara. Assim como os astros existem enquanto se movem, nós existimos enquanto amamos. Estas frases devem dar velocidade a nossa vida interior.

Terceira questão da arte de amar está em fazer-se um. Fazer-se um encerra um incurso a buscar o outro, seja ele quem for e na situação em que se encontra, sem preconceitos e pretensões, no sentido da dádiva e do dom. Seguir o ensinamento de Paulo em ter os mesmos sentimentos um para os outros.

Por fim, ainda é necessário amar o inimigo. Esta é uma novidade segundo Vera, que foi trazida por Jesus, de maneira superarmos a categoria de inimigo, fazendo o bem, mesmo a quem quer fazer o mal. Isso é uma mudança de cultura, uma vez que exclui o uso da força, abuso do poder, a opressão, a exploração e o uso da guerra. Para o nosso tempo isso é um convite incessante e permanente para nos desarmarmos, pensando que hoje existem muitos tipos de armas. Há que se desarmar o coração, a inteligência, a técnica, de maneira a inventar instrumentos, formas e métodos coerentes com a dignidade dos indivíduos e dos povos.

Esse pensamento precisa penetrar o cerne da vida humana, nossa família, nosso espaço de trabalho, nossa participação na sociedade. O amor deve se tornar uma atitude constante (portanto é quantitativo), deve ser durável e assumir diferentes elementos e valores (nesse sentido é qualitativo).
Esses são valores do amor ágape, indispensáveis e iniciam pela tolerância. Isso significa que nas relações o outro pode ser o que é e eu posso me manter, pelo menos em uma atitude de indiferença. Isso já é positivo, mas insuficiente, pois não cria relacionamentos construtivos. Um valor mais profundo é o respeito, que é mais que a indiferença, uma vez que reconhece no outro alguém que me comunica algo de si e me constrói. Isso gera construção.

Outro valor nobre desse amor é o dom, a dádiva, que se contrapõe a cultura do ter, do valor material, que emerge como liberdade. Está em andamento uma redescoberta da dádiva. Quanto mais você dá e, mesmo que você dê sempre mais, aquilo que você der, sempre receberá mais. Isso é o dom. Assim, o ser humano é capaz de doar-se e doar. Esta é uma capacidade intrínseca a sua natureza.

Pela fé isso é fruto da natureza de Deus que está no homem. Já, para os que não crêem isso tem a ver com nossa natureza relacional. E o dom precisa estar presente em nossas relações privadas e públicas, para construir uma sociedade civil.

As características da verdadeira dádiva são: ser gratuita, altruísta, sem interesse. É alegre, é dar-se com satisfação, é generosa, é simples, é sincera e não é calculada. A dádiva é desinteressada e não utilitarista. Segundo Chiara devemos dar sempre um perdão, um sorriso, um momento de atenção, nossa vontade, nossa atenção, nossos talentos, nossas experiências, nossas capacidades, nossos bens, para que nada se acumule e tudo circule. Dar deve ser uma palavra sem tréguas. Tal como a planta criada por Deus, que absorve do terreno só a água necessária, nós devemos nos esforçar em possuir só o que precisamos. É melhor ser um pouco mais pobre do que um pouco mais rico do que o necessário.

A solidariedade é outra virtude importante do amor ágape. Solidariedade é partilhar forças vivas da sociedade. Não é apenas se empenhar em fazer alguma coisa, é uma virtude que nasce não só na ajuda ao outro, mas também na participação ativa na sociedade, se empenhando para o bem de todos e de cada um, pois cada um é responsável por todos.

Tolerância, respeito, dom, solidariedade são algumas expressões do amor ágape. Disso pode crescer o homem novo e levar à aproximação da realização humana. Mas há uma pergunta escondida nisso, qual seja: somos capazes de tanto?

Bento XVI dedicou uma encíclica à esperança, na qual mostra que sofrer com o outro e pelos outros, por causa do amor, e para se tornar pessoa que ama verdadeiramente, é ser fundamentalmente humano. Abandonar estes elementos destruiria o homem. E será que somos capazes disso, de pensar que o outro é suficientemente importante e que eu sou capaz de sofrer por ele? Historicamente, cabe à fé cristã o mérito de ter suscitado no homem, de maneira nova, a capacidade dos referidos modos de sofrer para a sua humanidade. Verdade, justiça e amor são elementos de imensa realidade. Com efeito, mostraram-nos que Deus sofreu por nós e conosco.

Que tipo de antropologia serve então para esse contexto? Para fazer economia de comunhão à altura dos tempos e do desafio global? No curso de sua história o ser humano foi chamado a enfrentar novas realidades e a olhar para horizontes desconhecidos. Isso ocorre desde os grandes navegadores, por exemplo. E, o ser humano sempre conseguiu colocar-se em jogo e renovar-se em seu protagonismo, segundo o projeto pleno do amor de Deus, que escolheu o homem para ser seu representante na Terra. A consciência do ser humano começou a se desenvolver quando ele se descobriu homo sapiens, faber, economicus, politicus, comunitarius, psicologicus, ludens, consumens..., segundo a transformação da vida pessoal e social. Nisso vem à tona uma ou outra realidade.

A busca de soluções unitárias parece exigir um tipo de ser humano diferente, menos setorial, mais global. Capaz de abraçar todas as dimensões da vida: imaterial e material, relacional e individual, dentre outras. Ou seja, um homo agapius, que ama, que procura amar, que aprende a amar, que encontra no amor a luz e a verdade. Que em comunhão transforma e cria novas estruturas políticas, econômicas, civis. Novas formas colocadas na realidade da vida de cada dia, promovendo a liberdade, a justiça e o amor.

Este homem põe na comunhão todas as diferenças. É o homem que Chiara ensinou e que a economia da comunhão procura colocar na realidade de cada dia.

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