Ao longo desta semana, estou oferecendo uma série diária de perguntas e respostas em preparação à beatificação do Papa João Paulo II no próximo domingo. Hoje, começamos com a questão talvez mais frequente, tanto na mídia quanto na base: qual é a pressa? Por que isso está acontecendo tão rápido, enquanto outras causas, às vezes, padecem durante séculos?
A análise é John L. Allen Jr., publicada no sítio National Catholic Reporter, 25-04-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Os números sobre a causa de João Paulo II são uma questão de recorde. A beatificação ocorre seis anos e 29 dias após a sua morte no dia 2 de abril de 2005, tornando-a a beatificação mais rápida dos tempos modernos, desbancando Madre Teresa em 15 dias. Em ambos os casos, a velocidade foi possível porque o Papa renunciou ao período normal de cinco anos de espera após a morte do candidato, a fim de iniciar o processo.
Porém, se isso equivale a "pressa" está nos olhos de quem vê.
Como o padre jesuíta James Martin observou, uma vez que haja um milagre documentado, teologicamente poderíamos dizer que Deus aprova esse ritmo. Além disso, para a grande faixa da população tanto dentro quanto fora da Igreja Católica convencida de que João Paulo II foi um santo em vida e que a canonização é uma formalidade, a questão-chave não pode ser por que isso está acontecendo tão rapidamente, mas sim porque está demorando tanto.
Um estudo oficial da vida de João Paulo II que levou a um "decreto das virtudes heroicas" em dezembro de 2009, autorizando João Paulo II a ser referido como "venerável", coletou testemunhos de mais de 100 testemunhas formais e produziu um relatório de quatro volumes. George Weigel escreveu recentemente que, como resultado, os católicos têm "muito mais detalhes sobre a vida e as realizações de Karol Wojtyla, o Papa João Paulo II, do que o eleitorado norte-americano sobre a vida e as realizações de Barack Obama, ou do que o eleitorado britânico sobre a vida e as realizações de David Cameron e de Nick Clegg".
Além disso, a beatificação de João Paulo II pode ser a mais rápida dos últimos tempos, mas dificilmente será o processo mais veloz a ser registrado. Essa distinção pertence a Santo Antônio de Pádua, que morreu em junho de 1231 e foi canonizado menos de um ano mais tarde pelo Papa Gregório IX. Antônio bateu ainda seu mestre, São Francisco de Assis, que foi canonizado 18 meses após a sua morte, em outubro de 1226 (também por Gregório IX).
Na verdade, os mais inclinados a questionar a "pressa" muitas vezes têm outras razões para o sentimento ambivalente com relação a João Paulo II – o seu histórico na crise dos abusos sexuais, por exemplo, ou o teor mais "evangélico" do seu pontificado, em oposição ao espírito de reforma interna da Igreja associada ao Concílio Vaticano II (1962-1965).
Aliás, é difícil imaginar que muitos progressistas católicos estariam em pé de guerra se, por exemplo, o arcebispo Oscar Romero, de El Salvador, tivesse sido beatificado apenas seis anos após seu assassinato em 1980. O debate sobre a "rapidez" da causa da canonização, em outras palavras, está quase sempre envolto com o "quem" e o "porquê".
Dito isso, para uma instituição que normalmente pensa em séculos, seis anos e meio não deixa de ser espantosamente rápido. Certamente pode-se perguntar sobre o ritmo da beatificação sem soçobrar em dissenso teológico, ou pôr em causa a santidade de João Paulo II. Reportagens de 2008, por exemplo, sugeriam que o cardeal italiano Angelo Sodano, então secretário de Estado de João Paulo II, havia escrito à autoridade encarregada pela causa de João Paulo II para manifestar uma preferência a esperar enquanto os procedimentos de canonização estivessem em andamento para outros papas, incluindo Pio XII e Paulo VI.
Há pelo menos cinco fatores que explicam o ritmo em que as coisas estão se movendo no caso de João Paulo II.
Primeiro, o próprio João Paulo II revisou o processo de canonização, em 1983, para torná-lo mais rápido, mais fácil e mais barato, com a ideia de levantar modelos contemporâneos de santidade para um exausto mundo moderno. Apesar de João Paulo II e Madre Teresa serem os únicos em casos em que o período de espera foi dispensado, eles são apenas dois de mais de 20 casos desde 1983 em que um candidato chegou à beatificação 30 anos após a morte – uma lista que inclui uma mistura de beatos famosos (Padre Pio, Josemaría Escrivá, fundador do Opus Dei) e relativamente obscuros (Anuarita Nengapeta, uma mártir do Congo, e Chiara Badano, um membro leigo dos Focolares).
Nesse sentido, o ritmo da beatificação de João Paulo II é um subproduto natural de suas próprias políticas de santificação, que valorizam a demonstração de que a santidade está viva aqui e agora.
Em segundo lugar, supõe-se que a santidade é um processo democrático, começando com uma convicção popular de que uma determinada pessoa viveu uma vida santa e digna de ser imitada. No passado, a fama de um candidato muitas vezes se espalhava só gradualmente, mas hoje o mesmo lapso de tempo nem sempre se aplica. O papado de João Paulo II explorou habilmente duas das marcas da aldeia global de hoje: a ubiquidade das comunicações e a relativa facilidade das viagens. Como resultado, pode-se argumentar que o ritmo de sua beatificação nada mais é do que um reflexo da maior velocidade com que tudo se move no século XXI.
Em terceiro lugar, apesar das reformas de João Paulo II, a canonização continua sendo um processo complicado. Causas que se movem rapidamente tipicamente têm uma organização por trás, capaz de fornecer os recursos e a experiência para fazer o sistema funcionar. O Opus Dei, por exemplo, pôde recorrer a alguns dos melhores advogados canônicos da Igreja Católica para promover a causa do seu fundador, e os Focolares têm membros motivados com boas ligações com o Vaticano por trás da causa de Badano. No caso de João Paulo II, a infraestrutura da Igreja Católica na Polônia, assim como na diocese de Roma, estão solidamente por trás da causa, garantindo que ela não definhe por falta de apoio institucional.
Em quarto lugar, os tomadores de decisão na Igreja de hoje são em grande parte nomeados e protegidos de João Paulo II, o que lhes dá uma motivação biográfica poderosa para querer ver o seu mentor elevado à santidade durante suas próprias vidas. Essa lista inclui o próprio Papa Bento XVI; assim como o cardeal Stanislaw Dziwisz, de Cracóvia, na Polônia, e antigo secretário particular de João Paulo II, para quem manter a memória de João Paulo vivo representa uma vocação sagrada. Dziwisz completa 72 anos no dia 27 de abril, tornando a beatificação do dia 1º de maio um presente de aniversário perfeito, e não há dúvida de que ele gostaria de ver a canonização acontecendo antes que ele saia dos holofotes aos 80 anos, a idade da aposentadoria.
Em quinto lugar, há o simples fato da demanda popular. O afeto por João Paulo II continua sendo palpável ao redor do mundo, e, em muitos casos, as pessoas não estão à espera de aprovação formal para considerá-lo como um santo. A revista italiana Epoca, por exemplo, estampou a manchete "O Santo Papa" em sua capa desta semana, sem trabalhar a diferença entre beatificação e canonização.
Será que o mesmo ritmo acelerado irá impulsionar João Paulo II para a linha de chegada da canonização em tempo recorde?
Há inúmeras variáveis envolvidas, uma das quais é a necessidade de um outro milagre documentado. O caso da Madre Teresa pode ser instrutivo: embora quase todo mundo considere a sua canonização como uma conclusão prévia, sete anos e meio se passaram desde a sua beatificação em outubro de 2003, e os organizadores de sua causa ainda estão procurando por um milagre que satisfaça os testes rigorosos da Congregação para as Causas dos Santos do Vaticano.
Também é possível que isso eleve a precaução, especialmente se surgirem novas revelações sobre a resposta à crise dos abusos sexuais durante o papado de João Paulo II. Mesmo que nada disso ponha em causa a santidade pessoal de João Paulo II ou as altas conquistas do seu pontificado, alguns poderiam argumentar em favor da espera até que se diminua a sensibilidade da reação das vítimas de abuso clerical.
Finalmente, um fato marcante sobre a abordagem de Bento XVI à canonização é que, embora não tenha abrandado o ritmo das beatificações, ele mostrou uma maior paciência quando se trata de canonizações. João Paulo aprovou 1.338 beatificações ao longo de 26 anos, uma média de 51 por ano. Bento até agora assinou 789, ou 131 por ano. No entanto, Bento XVI não está canonizando com o mesmo frenesi. As 482 canonizações de João Paulo equivalem a mais de 18 por ano, enquanto as 34 de Bento até agora representam uma média anual de pouco menos de sete anos. Esse contraste pode sugerir um atraso um pouco mais longo antes que João Paulo II seja oficialmente declarado santo.
Por outro lado, os quatro fatores listados acima para explicar o rápido progresso da beatificação de João Paulo II ainda estão em seu lugar, e todos se aplicam em uma medida muito semelhante às perspectivas de uma rápida canonização.
No final, Martin pode estar certo. Se outro milagre vier rapidamente e sobreviver ao escrutínio médico e teológico usual, pode-se dizer que é Deus quem mantém João Paulo II na pista rápida.
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