A foto que amanhã irá chegar aos jornais entra na história das Américas: presidente dos Estados Unidos em oração no túmulo do bispo Romero (foto) assassinato (24 de março há 31 anos) em nome da "guerra ao comunismo", ordenada por um outro presidente de Washington cansado da Igreja que defendia os agricultores abandonados aos esquadrões da morte. Anos de Reagan, anos de Obama.
Romero está sepultado no subsolo da catedral de San Salvador, última passagem de Obama na longa viagem à América Latina. Há 31 anos, essa era a igreja devorada por um incêndio e, aos domingos, angustiada com as homilias do bispo. Ele lia os nomes dos jovens, intelectuais, sindicalistas mortos pelas botas militares como na Argentina dos generais P2. Silêncios dos jornais, silêncio da TV. Romero não se resignava. Denunciava (nomes e sobrenomes) os altos uniformizados responsáveis pelos delitos.
Enfim, um subversivo vermelho como os jesuítas e tantos religiosos que acabaram debaixo da terra em nome da liberdade do livre mercado. Nenhuma outra comunidade de fiéis jamais havia sofrido esse tipo de perseguição depois do nazismo. Só a dor por um sacerdote assassinado perto de Varsóvia, Igreja oficial do silêncio, enquanto a morte de 14 religiosos e de milhares de fiéis de El Salvador desvaneciam nas sombras do Vaticano de João Paulo II.
Se os povos latinos consideram Romero como "mártir e santo", os monsenhores romanos estudam com desconfiança a sua beatificação, rapidamente concedida ao pobre padre polonês espancado até a morte pelos esquadrões que obedeciam a Moscou, a mesma obediência dos esquadrões que, em El Salvador, se inclinavam aos 6 milhões de dólares gastos por dia por Washington para "defender o mundo cristão".
Era 1980, Idade Média da razão. A Igreja luterana e a Igreja anglicana lembra o martírio de Romero a cada 24 de março. E, em seu nome, o dia 24 de março é consagrado pelas Nações Unidas como "dia da defesa da verdade".
Agora, o encontro entre Obama e o bispo, separados pela morte, mas unidos por uma moral que abre a esperança às gerações dos anos 2000. Homens de paz, ao lado da dignidade dos últimos, com uma diferença que os nossos dias ampliam.
Romero arriscou sua vida para defender o direito à normalidade de desconhecidos sem censo. Com os mesmos ideais, Obama pressiona o botão da guerra para salvar cidadãos que aspiram à democracia. Bombas boas de Obama; bombas más de Kadafi. E o povo condenado a suportar seu efeitos colaterais não se dá conta da diferença.
Da forma como o conheci, imagino que Romero não estaria de acordo. O primeiro encontro foi no domingo 29 de junho de 1978. Parecia um padre do interior. Descia do pequeno automóvel dirigido por um seminarista, e a túnica se levantava, descobrindo um tornozelo pálido, calça dobrada sobre os sapatos de elástico rasgado. Ternura e desilusão: como pode, tão frágil, desafiar o egoísmo das oligarquias proprietárias de jornais e de TVs que a cada dia o massacram com insultos?
Depois dos boatos em San José, seminário transformado em acampamentos para os refugiados em fuga da zona rural, onde as tropas especiais (bombas de fósforo, quepes verdes adestrados por conselheiros norte-americanos) queimava as pessoas para limpar a região da guerrilha: "Matar para assustar é um pecado insuportável, insulto à humanidade, insulto a Deus". E depois até a última saudação: "Por que os jornalistas voltam para casa? Sem testemunhas, as luzes se apagam. Quem sabe o que irá acontecer". Três meses depois, atiram nele ao altar.
O assassino, promovido a capitão, ainda vive nos EUA. "Inencontrável" pelas polícias de Bush pai, de Bush filho e de Clinton presidente. Será que Obama o encontrará?
A reportagem é de Maurizio Chierici, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 22-03-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
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