sexta-feira, 19 de novembro de 2010

EI, ZUMBI ME FAZ REENCONTRAR COM SUA NEGRITUDE EM MIM!

A população negra em nosso país tem como referência principal A LUTA DO QUILOMBO DOS PALMARES pela construção de uma sociedade alicerçada na ética, na justiça, na liberdade, uma sociedade mais humana. Desde o início de nossa história os negros são tratados com inferioridade, sem direitos e relegados a uma vida indigna e desumana. Ainda hoje, os povos negros têm dificuldade em mostrar o seu valor, de serem sujeitos históricos de suas realidades na arte, na cultura, na mídia, na política... na sociedade. Apesar da discriminação, da exclusão - indiferença - existem expressões fortes da cultura afro, que resistem e persistem, no seio das manifestações sociais do Brasil.

Sou negro, sou lindo, sou cidadão.

Ei, Zumbi, Zumbi Ganga meu rei, você não morreu, você está em mim!" Este canto de esperança é um grito, um clamor a Zumbi dos Palmares, herói não apenas dos negros, mas de todo o povo brasileiro. E por quê? A LIBERDADE é o grito do Quilombo dos Palmares, é a autenticidade da luta negra, dos negros escravos da senzala... IGUALDADE é o brado forte dos tambores, atabaques e batuques, cantada e esperançada no sangue derramado, na ternura e resistência pela humanidade negra.

Zumbi e todos que se inquietaram e se inquietam; não se calaram, não se calam; não se omitiram, não se omitem; que acreditaram e acreditam; que doaram e doam suas vidas, na luta pela liberdade e igualdade são os atores que fazem a gente, o Brasil a se reencontrar com a nossa identidade negra.

O Brasil ainda está longe de assegurar direitos iguais a todos os seus cidadãos. A ideia que vivemos em um país livre do racismo, a chamada "democracia racial" tão defendida por Gilberto Freyre não existe. Segundo o sociólogo e antropólogo brasileiro a miscigenação entre brancos, negros e índios fora a maneira encontrada pelo país para viabilizar a convivência pacífica e harmoniosa entre as diferentes raças (FREYRE, 2006). O mito da democracia racial esconde nos "porões da história", os processos de exclusão e de marginalização dos negros na sociedade brasileira.

Podemos destacar a sub-representação da população negra no poder do Estado nas suas várias esferas e as desigualdades sócio-raciais. A dimensão política da desigualdade racial está estreitamente ligada e exclusão da população negra dos espaços de poder e consequentemente das decisões sobre o destino dos esforços e bens coletivos.

Com relação às posições de poder no âmbito da justiça, por exemplo, que entre "o grupo formado por juízes e desembargadores federais, aproximadamente 7% se declararam pretos ou pardos, sendo que 14% dos bacharelados se declararam negros" (PNUD, 2005: 48). Na esfera estatal "é visível que os negros não conseguem fazer prevalecer suas necessidades em muitas políticas públicas, pois estão sub-representados em todas as posições de poder" (Ibdem, 2005: 50).

Na economia e no mercado de trabalho é evidente a exclusão dos negros. Segundo o Pnad de 2003, em torno de 46% da População Economicamente Ativa (PEA) e 48% dos que atuam por conta própria eram profissionais negros, porém emergem desigualdades na representação proporcional com relação à atividade produtiva, pois os negros estão sobre-representados nos nichos de mercado menos valorizados, como construção civil, comércio ambulante e setor de serviços, que envolvem trabalhos manuais e pesados. No comércio não-ambulante entre as profissões liberais e no ramo de serviços auxiliares de atividades econômicas, que agregam trabalhos e ocupações mais valorizados pela sociedade, estão sub-representados, independente da região (Ibdem, 2005:51).

No que tange a presença das pessoas negras nos cargos de direção e gerência das 500 maiores empresas do país, em 2003 no nível mais elevado das hierarquias (executivo) dessas companhias apenas 1,8% dos funcionários era negro. Nos cargos de gerência, chefia e todo quadro funcional 8,8%; 13,5% e 23,4% respectivamente.

Nesse sentido, quanto mais se avança rumo ao topo das hierarquias de poder, mais a sociedade brasileira se torna branca, este em todos os espaços decisivos para a formação e manutenção de poder. Portanto, esta realidade se configura em uma situação que contribui na persistente desigualdade racial no desenvolvimento humano brasileiro, resultado histórico de uma discriminação dos brancos contra as pessoas de fenótipo africano.

Na sociedade brasileira, a ausência de políticas públicas e sociais direcionadas aos descendentes de escravos e escravas contribuiu para deixá-los na pobreza.

Pobreza não apenas de renda, mas pobreza humana (...) a pobreza humana não enfoca o que as pessoas possuem ou deixam de possuir, mas o que elas podem ou não fazer. É a privação das capacidades mais essenciais da vida, incluindo desfrutar de uma vida longa e saudável, ter acesso ao conhecimento, ter recursos econômicos adequados para uma vida digna e poder participar da vida comunitária, defendendo seus interesses (PNUD, 2005: 57).

A diferença entre o desenvolvimento humano da população branca e o da população negra do Brasil está ligada, sobretudo à renda:

Embora os negros representem 44,7% da população do país, sua participação chega a 70% entre os 10% mais pobres e seus rendimentos, somados, correspondem a 26% do total apropriado pelas famílias brasileiras. Em 2003, os homens brancos ganhavam em média 113% mais que os homens negros, e as mulheres brancas, 84% mais que as mulheres negras (PNUD, 2005: 60).

Em 1888, os negros foram libertados da escravidão. Libertados? Deixaram de ser escravos dos senhores de engenho, mas se tornaram filhos rebentos da nação sem nenhuma política social, indenizações que permitisse o mínimo de integração e direitos sociais: foram jogados à rua, nas favelas, nos bolsões de miséria, sem casa, saúde, trabalho, educação... os negros são maioria nos presídios e nas favelas, são a maioria dos analfabetos e recebem os menores salários. O Brasil tem um legado: resolver o seu passado!

O debate sobre a temática racial no Brasil deve ser realizado amplamente e apesar do abismo existente entre negros e brancos temos conquistas, principalmente no campo das políticas de identidade e de reconhecimento. O estabelecimento do 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra e o reconhecimento de Zumbi dos Palmares como herói nacional são um exemplo. Há também a Lei nº 10.639/2003, que inclui, no currículo escolar, o ensino da história afro-brasileira, bem como a valorização da estética e da cultura negra. Ampliou-se o diálogo com o Estado na luta por direitos, incluindo na agenda nacional o reconhecimento e o combate às profundas desigualdades sociais entre negros e brancos, com a adoção das políticas de ações afirmativas.

Os desafios são grandes: aglomerar um maior número de ativistas que provenham das classes populares, bem como reforçar a importância do movimento negro e aumentar a sua participação nos espaços de decisão. Outro ponto a ser enfrentado é a questão das cotas nas universidades e, consequentemente a construção de uma agenda que privilegie a luta a favor dos direitos humanos que seja direcionada contra a pobreza, a violência e o racismo no Brasil.

Zumbi, liderando o Quilombo dos Palmares, foi um herói negro das Américas. Palmares é a chama, é o sonho, é a esperança apagada na História dos livros, mas arde em nossos peitos, corações, sentimentos, ideais e almas no nosso caminhar. O 20 de novembro é o nosso símbolo de liberdade, o sonho que deve ser buscado até que o Brasil reconheça de fato todos os brasileiros.

"Ei, Zumbi, nessa terra fértil, outros como você também tombaram ao chão (...) e muitos tombarão, enquanto houver luta pela libertação".

Axé, Resistência e Compromisso!

Referências:
O BRASIL. Relatório de Desenvolvimento Humano - Brasil 2005: racismo, pobreza e violência. PNUD: Brasília-DF, 2005.

FREYRE, Gilberto. Casa Grande e Senzala. 50 ed. Global: São Paulo, 2006.

Mário Henrique Lopes Moura,
Especialista em Educação Especial, Pedagogo e Professor de Ensino Religioso, militante da Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP).
Endereço eletrônico: mario_pedagogia@hotmail.com

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