Envolvido com a preparação da Carta Final do 12º Encontro Intereclesial das CEBs , realizado em Rondônia, de 21 a 25 de julho últimos, o padre e teólogo José Oscar Beozzo interrompeu por alguns minutos suas atividades no evento para conceder a entrevista que segue, por telefone à IHU On-Line. Nela, ele fala sobre a novidade deste encontro, sobre a história das CEBs no Brasil e sobre os novos desafios a serem enfrentados pelas Comunidades Eclesiais de Base atualmente. Entre eles, o principal é a questão ecológica. Para Beozzo, ao longo da história das Comunidades Eclesiais de Base, é afirmado que elas “assumem o compromisso na construção de uma nova sociedade; um compromisso político ao lado do eclesial. Isso faz o rosto das CEBs”. E sobre a mais recente encíclica do Papa Bento XVI, Caritas in Veritate, ele considera que ela traz “um apoio importante para o compromisso social da Igreja e para o compromisso ecológico”.
José Oscar Beozzo, historiador, é coordenador-geral do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (Cesep). Mestre em Sociologia da Religião, pela Université Catholique de Louvain (Bélgica) é doutor em História Social, pela Universidade de São Paulo (USP). Faz parte do Centro de Estudos de História da Igreja na América Latina (CEHILA-Brasil), filiado à Comissão de Estudos de História da Igreja na América Latina e no Caribe (CEHILA). É autor de inúmeros livros, entre os quais A Igreja do Brasil (Petrópolis: Vozes, 1993).
José Oscar Beozzo, historiador, é coordenador-geral do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (Cesep). Mestre em Sociologia da Religião, pela Université Catholique de Louvain (Bélgica) é doutor em História Social, pela Universidade de São Paulo (USP). Faz parte do Centro de Estudos de História da Igreja na América Latina (CEHILA-Brasil), filiado à Comissão de Estudos de História da Igreja na América Latina e no Caribe (CEHILA). É autor de inúmeros livros, entre os quais A Igreja do Brasil (Petrópolis: Vozes, 1993).
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Qual a visão da Amazônia que foi passada neste 12º Encontro Intereclesial?
José Oscar Beozzo – Foi passada aqui uma visão de experiência. Em primeiro lugar, com o nome que foi dado a cada um dos grandes blocos de assembléias, de 250 pessoas. Cada um recebeu o nome de um rio chave da Amazônia: o Madeira, Juruá, o Rio Negro, etc. Cada um desses grandes rios foi lugar de encontro. As pessoas tiveram que tomar contato com a bacia amazônica. Em segundo lugar, ontem (dia 23/07) foi feito um dia de imersão na realidade local. As pessoas partiram para se encontrar com comunidades ribeirinhas, com comunidades extrativistas, da periferia da cidade, com comunidades afro e indígenas. Foram também aos hospitais, às prisões, para ver a gente que sofre. Os participantes puderam tomar o pulso diretamente da realidade amazônica. O que também vem marcando muito, desde a celebração de abertura, é a presença de 39 povos indígenas aqui da região amazônica. Os organizadores souberam introduzir todos os delegados no coração da experiência dessa região, começando pela celebração de abertura, que foi no início da estrada de ferro Madeira-Mamoré, onde milhares de pessoas morreram na construção, e que marca o ciclo da borracha na região amazônica.
IHU On-Line – Como a preocupação ecológica apareceu no evento?
José Oscar Beozzo – É importante falar aqui sobre os desafios do campo ecológico aqui na região amazônica. Eles foram levantados nos plenários do evento com muita força. O primeiro é o acuamento dos povos indígenas pela expansão do desmatamento, que avança, sobretudo, através da pecuária. A outra questão é a contaminação da água no Rio Madeira. Há dezenas de garimpos de ouro e todos eles usam mercúrio para separar e decantar o ouro. Os peixes se contaminam, as pessoas que o comem também, e assim há a contaminação de toda a cadeia alimentar. A outra questão são as madeireiras e a derrubada de madeira nas áreas indígenas, que são áreas de preservação ambiental. Também alguns falaram na pesca predatória nos lagos e rios, com redes, e o ribeirinho, que precisa da pesca, começa a ficar sem o peixe. Foi levantada também a questão de que, a cada nova rodovia que se abre, há o desmatamento desenfreado nessas áreas. Aqui na cidade de Porto Velho o grande debate são as duas hidrelétricas do Rio Madeira. A celebração dos mártires foi feita às margens da cachoeira de São Antônio, onde o rio já está sendo desviado e está sendo concretada a primeira das duas barragens. No entanto, há conquistas também. Foi muito lembrada, por exemplo, a demarcação contínua da área Raposa Serra do Sol. Porém, no final da celebração de abertura, distribuíram bombons de cupuaçu e café e, depois, havia um mar de papeizinhos de bombom no chão. Então, os cuidados começam em não sujar a natureza, não jogar lixo no chão. É preciso reduzir o lixo e reciclá-lo da melhor forma possível. Há questões pequenas e concretas, ao lado de grandes lutas, como o desmatamento e a água. Como vieram pessoas do Brasil inteiro, elas trouxeram as questões ambientais dos seus estados. Tivemos o retrato de um Brasil muito diferente.
IHU On-Line - Qual a importância da encíclica Caritas in veritate, de Bento XVI, no contexto deste evento em Rondônia?
José Oscar Beozzo – Temos aqui três coisas diferentes. Uma delas, muito auspiciosa, é a retomada da reflexão da Igreja em relação às questões sociais. Essa encíclica vem na linha direta da Populorum Progressio, de 1967, retomando o tema do desenvolvimento no quadro da crise econômica atual, e tem todo um capítulo onde a questão ecológica é colocada. A segunda questão é que ela é ainda muito recente. Precisamos de um tempo para estudá-la e assimilá-la. Ela chegou – como dizem vocês aí do Rio Grande do Sul – muito “encima do laço” do Intereclesial. No entanto, temos ouvido referências. O próprio Leonardo Boff, na sua fala aqui no evento, retomou as questões ecológicas levantadas pela encíclica. E a terceira questão é ver como esse chamado vai chegar no chão das pessoas e das comunidades. Mas é preciso reconhecer que a encíclica traz um apoio importante para o compromisso social da Igreja e para o compromisso ecológico.
IHU On-Line – Qual a importância que o senhor atribui ao 12º Intereclesial? Quais as novidades que têm observado nele em relação às demais edições realizadas?
José Oscar Beozzo – O evento andou muito bem: houve envolvimento da população local, das comunidades e tudo foi bem preparado. Cada comunidade ofereceu uma festa na quinta-feira à noite e todos estavam muito felizes. O que destaco de novidade é o tema e essa imersão no mundo amazônico. A ecologia é uma questão grave nesse momento e é bom que as CEBs assumam isso. O segundo ponto diferente é a forma como o encontro foi feito. Nunca tinha sido assim nos outros intereclesiais, de dedicar o dia inteiro para as pessoas tomarem contato com as realidades locais. Ninguém voltará com um discurso, mas com uma experiência muito concreta de algumas dessas realidades da região amazônica. Oferecer isso aos delegados foi extremamente importante e rico. Outro elemento surpreendente é que estamos em um lugar tão longe e há 56 bispos que estão aqui presentes. É o maior número de todas as edições do encontro. É igualmente marcante a presença forte dos grupos indígenas. Essas realidades fazem a originalidade deste intereclesial.
IHU On-Line - Quais os principais desafios e limites das CEBs hoje e como isso aparece nos encontros intereclesiais?
José Oscar Beozzo – Sinto um clima de retomada e de entusiasmo. A Conferência de Aparecida retomou as CEBs dentro da Igreja com muita força. Mas isso não muda os desafios. E um deles é a questão da juventude. Em muitos lugares, as CEBs envelheceram. Uma surpresa boa aqui em Porto Velho foi ver a quantidade de jovens envolvidos em todos os trabalhos. Os delegados fizeram questão de trazer um grupo grande da Pastoral da Juventude. Outro desafio é a presença e a atuação das CEBs na periferia das grandes cidades. A experiência inicial das CEBs teve um rosto rural muito forte e hoje vivemos num país onde praticamente 85% da população está nas zonas urbanas. Incorporar os desafios ecológicos também deve ser uma meta para as CEBs de hoje.
IHU On-Line - Como o senhor define a história das CEBs na Igreja do Brasil?
José Oscar Beozzo – No grande plenário aqui do evento, muito bonito, estive olhando no “Trem das CEBs” os doze intereclesiais e observei alguns deslocamentos. Os cinco primeiros começavam com a palavra Igreja, partindo desse tema. Depois, a expressão forte virou “Povo de Deus”. Agora, pegando o deste ano “o grito que nasce da Amazônia” está mais solto, para não ficar tanto em determinadas questões que eram muito importantes no início, como recuperar essa dimensão de que nós somos a Igreja. Esse foi um ponto muito forte das CEBs, tema inclusive da primeira Campanha da Fraternidade. Outro ponto, ao longo desta história, é afirmar que as Comunidades Eclesiais de Base assumem o compromisso na construção de uma nova sociedade; um compromisso político ao lado do eclesial. Isso faz o rosto das CEBs.


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