Se há um assunto que precisa ser bem pensado é o Código Florestal. Ele implica com o meio ambiente. Mas implica também com a viabilidade da agricultura. E em decorrência, com a produção de alimentos e com a sobrevivência de milhões de agricultores.
A abordagem deste assunto requer equilíbrio e bom senso. É necessário levar em conta o conhecimento científico e as advertências da ecologia sobre a preservação do meio ambiente. Mas é preciso igualmente levar em conta os grandes avanços tecnológicos da agricultura, que possibilitam agora colocar em outros termos a preservação ambiental.
Por isto, o Código Florestal não pode se abrigar debaixo de uma bandeira única. Seja ela bandeira dos ecologistas. Ou bandeira do agronegócio. Ou bandeira dos agricultores familiares. Ele precisa atender ao mesmo tempo a todas as demandas legítimas dos diversos reclamos que devem encontrar audiência num novo Código Florestal, que leve em consideração o conjunto dos aspectos a serem devidamente contemplados.
Uma das evidências que salta aos olhos, e precisa ser levada em consideração, é a grande diversidade de solos existentes no território brasileiro. Um Código Florestal sábio e adequado precisa ter como ponto de partida esta diversidade, que não pode ser impunemente padronizada. Precisa ser um código que comporte adequações e averiguações de circunstâncias. O assunto tem semelhança com os biomas. Demorou tanto para dar-nos conta da diversidade de biomas existentes no Brasil. O retrocesso real seria agora um Código Florestal que ignore esta diversidade.
Outra evidência é o avanço tecnológico na agricultura, já amplamente assimilado, sobretudo a grande diferença que faz o plantio direto, pelo qual se evita a erosão. Há certos dispositivos do atual Código Florestal que demonstram completo desconhecimento desta nova técnica, que veio revolucionar o cultivo de grãos em nosso país.
Com o plantio direto fica mais do que superada a prescrição de não utilizar para a agricultura os solos que tenham 45 por cento de inclinação. Os agricultores que constatam esta distorção se irritam justamente, e passam a desacreditar da validade do atual Código. Na verdade, se aplicados estes dispositivos, ficariam inviabilizados milhões de pequenos empreendimentos agrícolas, provocando um problema social inútil e de grandes proporções, que precisa ser evitado a todo custo, em última análise pela responsabilidade da Presidência da República.
Tive o cuidado de fazer uma breve pesquisa. No pequeno município denominado Sul Brasil, no Oeste Catarinense, na região de Chapecó, o Prefeito empreendeu um amplo programa de preservação do solo, em vista da viabilização da agricultura, atividade de quase todos os 3.500 habitantes, num território de 114 quilômetros quadrados. Pois bem, em todo o pequeno município foram encontrados 83 veios de água, que formam "sangas”, que demandam aos córregos Pesqueiro e Burro Branco, que delimitam o município. De comum acordo, a prefeitura incentivou os agricultores a preservarem as margens, numa largura de dez a doze metros, em vez dos 30 que o Código prescreve. A solução, incentivada pela Prefeitura que forneceu gratuitamente o arame farpado para as cercas, ficou de bom tamanho, e os agricultores de Sul Brasil continuam, como brasileiros imbatíveis, cultivando com competência e com amor a terra que os acolhe e responde com generosidade ao seu nobre trabalho.
Esta foi a solução para Sul Brasil. Cada município precisa encontrar a sua. E quem quiser opinar sobre o Código Florestal precisaria primeiro passar pelo teste de distinguir entre "fonte”, "vertente”, "sanga”, "córrego”, "riacho” e rio.
Se fosse urgir a aplicação do atual Código, ficaria inviabilizado não só o município de Sul Brasil, mas grande parte do Oeste Catarinense, e muitas outras regiões do País. O debate em torno das mudanças a serem introduzidas no novo Código Florestal exigem competência e responsabilidade.
Dom Demétrio Valentini
Bispo de Jales (SP) e Presidente da Cáritas Brasileira
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