terça-feira, 7 de junho de 2011

CRISTÃOS LEIGOS E CRISTÃS LEIGAS: MEMÓRIA, HISTÓRIA E PERSPECTIVAS

Texto escrito por Alex de Souza Rossi, secretário Geral do CNLB Sul I e Coordenador do Conselho Diocesano de Pastoral da Diocese de Lins, para o aniversário de 85 anos da Diocese de Lins. Neste, faz a análise da memória e história do laicato na Comunidade Igreja e na Diocese de Lins. Utiliza para tanto, como Bibliografia, os textos de Estudo do CNLB e o Plano de Pastoral Orgânica da Diocese de Lins.

Eis o artigo

Nas primeiras comunidades cristãs, o laós era povo eleito, com dignidade de sacerdote, profeta e rei dada pelo Batismo; povo esse com o qual Deus se relaciona, educa, salva e liberta, para fazer acontecer o seu Reino na história. Todo o laós era contemplado com o klerós, designação de sorte de ser escolhido e eleito. É assim povo eleito, consagrado e convocado para ser no mundo portador da esperança, sem distinção de cargos ou papéis. Uma Igreja com um só povo laós-klerós. Reunidos em comunidade, e sustentados pelo Espírito, juntos falavam, organizavam-se e decidiam. Não há uma parte subordinada e uma parte que determina o ser da igreja. Todos decidem em conjunto os rumos assumidos pela comunidade.

No decorrer do tempo, por decisão e delegação da comunidade reunida, surgem ministérios em decorrência da necessidade. Não uma decisão isolada, mas de todo laós. Na carta de São Clemente de Roma aos Coríntios (cap. 40,5) pela primeira vez é usado o termo laikós – leigo, classe plebéia e subordinada. Com o decorrer do tempo, existe um deslocamento do protagonismo da comunidade para a anulação da mesma. A vocação laical passa a ser assumida pela negativa, ou seja, é aquele que não é padre. Há uma inversão de valores. Aos leigos são lhes retirado os direitos imanentes ao Batismo e lhes sobram as funções de rezar, pagar e obedecer, tendo uma desqualificação do sacerdócio comum dos fiéis e, portanto, uma minimização da importância do Batismo como consagração a Deus, que precede e dá sentido à consagração da Ordem e dos votos religiosos. A Igreja torna-se sociedade perfeita, não cumprindo seu papel de instrumento do Reino e dissociando nitidamente profano e sagrado, mundo e igreja, corpo e alma. Aqui uma ruptura entre fé e vida é conseqüência.

Numa retomada aos trilhos, convoca o papa João XXIII, por sopro do Espírito e necessidade dada na realidade, o Concílio Ecumênico Vaticano II. Este provoca mudança para a concepção de que a graça, agora como sempre, está no mundo como em sua casa. É pelo humano e no humano que a graça de Deus está no mundo. Aqui, não há mais possibilidade de uma igreja hierárquica e piramidal, mas igreja povo, circular, cheia de carismas, serviços e ministérios, onde todos são igualmente dignos pelo Batismo e co-responsáveis por sua missão. Os leigos não são mais vistos como objeto da cura pastoral, mas chamados a serem sujeitos eclesiais. O mundo aqui é o lugar histórico onde a ação de Deus se realiza. Em sua oração, em Jo 17, Jesus diz que “eles estão no mundo”. Assim, os leigos são chamados a santificar o mundo, santificando-se nele.

Na Diocese de Lins, essa ruptura enraizadora proposta pelo Concílio assume 5 grandes ordens ligadas diretamente aos leigos e leigas: protagonismo da juventude, colegialidade pastoral, Comunidades Eclesiais de Base, formação permanente e organização do laicato. Esses 5 fatores darão sabor para o exercício de uma igreja laós-klerós.

O protagonismo e evangelização da juventude tornam-se nessa diocese motor articulador da vida eclesial. Organiza-se já em 1968 a Pastoral da Juventude e Universitária. Em 1977, realiza-se o II Concílio Nacional de Jovens, que acontece em 5 lugares diferentes da Diocese (Lins, Promissão, Birigui, Araçatuba, Andradina/Mirandópolis) e, novamente, em 1998, um III Concílio Nacional da Juventude encanta a Diocese.

A colegialidade na ação pastoral dá-se pela formação, em 1970, do Conselho Diocesano de Pastoral, a fim de potencializar o leigo de papel decisório, levar a igreja de volta ao mundo e ao mesmo tempo colaborar para a existência de uma igreja comunhão.

Paralelamente a isso, desencadeia-se uma multiplicidade de ministérios, realizados nas inúmeras Comunidades Eclesiais de Base, lugar de uma igreja toda ministerial. Fato que leva, em 1975, a Diocese de Lins ser uma das 13 dioceses do Brasil a enviar representantes para o I Intereclesial das CEBs, em Vitória.

No sentido da vivência consciente da vocação laical, como homem do mundo no coração da igreja e homem da igreja no coração do mundo, um processo de formação permanente torna-se claro e necessário. Revela-se essa face na formação do Instituto Teológico de Lins (em 1972) e com as Escolas de Formação Cristã das Regiões Pastorais a partir de 2010.

Muitos leigos nos diferentes lugares sentem a necessidade de uma organização para a melhor vivência de sua missão. Constitui-se o Conselho Diocesano de Leigos e, em 1993, a articulação do laicato na Diocese de Lins é coroada com o II Encontro Nacional de Leigos do Conselho Nacional do Laicato do Brasil, com o tema “Os cristãos e os desafios do Brasil: presença e compromisso”.

Um olhar histórico, situando-o na perspectiva de mudança de época ou crise de paradigma civilizacional proposta por Aparecida, faz com que o caminho da evangelização no século XXI passe pelo laicato consciente/organizado e inúmeras comunidades eclesiais de base presentes na realidade e próximas aos problemas e esperanças do povo. A Diocese de Lins antecipa na história as proposições dadas em Aparecida e nos documentos atuais da CNBB.

É possível dizer, à luz do 3º Plano de Pastoral Orgânica, inspirado em Aparecida, que o ano de 2011 tem caráter decisivo na retomada do caminho, por ser o ano da caridade. É o ano da refontalização, de uma Igreja que se redescobre como instrumento do amor de Deus para colaborar para que todos tenham vida plena. As motivações do plano apontam para o resgate do compromisso social e da organização do povo de Deus, evidenciado em articulação do grito dos excluídos, pastoral de fé e política, reflexões sobre direitos humanos e cidadania, articulação e participação popular. Pode-se dizer que o ano da caridade é por excelência o ano de se lançar na articulação do laicato.

Isso reforça novamente e nos estimula a viver intensamente, a revelia de idéias pré-concebidas, os 5 pilares anteriormente sustentados e expressos assim: Formação permanente do laicato, investimento na Pastoral da Juventude como grande articuladora da evangelização da juventude, articulação dos conselhos de pastorais, multiplicação das Comunidades Eclesiais de Base e incentivo constante para a articulação dos leigos no Conselho Nacional do Laicato do Brasil Diocesano. Tais passos ajudarão, no ano da Caridade, a Diocese mergulhar de cheio no sentido de uma Igreja laós-klerós, instrumento da Civilização do Amor.

Alex de Souza Rossi
Coordenador do Conselho Diocesano de Pastoral e Secretário Geral do CNLB Regional Sul I

BIBLIOGRAFIA:

CNLB (2008). Leigos e Leigas: de objeto a sujeito eclesial – Um estudo sobre o laicato. Caderno Especial de Formação do Conselho Nacional do Laicato do Brasil.
CNLB (2011). Texto preparatório para o VI Encontro Nacional do Laicato do Brasil – Rio de Janeiro, 2012.
Diocese de Lins (2010). 3º Plano de Pastoral Orgânica – Como Igreja discípula-missionária de Jesus Cristo.

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