domingo, 24 de abril de 2011

VIAGEM AOS LIMITES DO AMOR INFINITO

Convido os irmãos e irmãs .na fé a empreender comigo uma Viagem. Imaginemos que somos contemporâneos daqueles homens e mulheres que testemunharam a primeira Sexta-feira Santa da história.

Por ocasião da festa dos Ázimos, chamada Páscoa, é sempre grande o afluxo de peregrinos chegados a Jerusalém. Estamos entre eles ..Desta vez presenciando estranhos acontecimentos.

Quem vem de longe, à porta da cidade, enxerga fincado lá no monte algo semelhante a um espantalho. Mais adiante, numa curva da estrada, um homem de costas. Corpo encurvado e mãos sustentando a cabeça, manifesta sinais de desespero. "É Judas, o Iscariotes", dizem uns. "É ele mesmo", outros confirmam. "E foi por 30 dinheiros", é a voz corrente.

Mais à frente, outro homem de olhar perdido. Lágrimas a rolar-lhe nas faces, parecia estar sofrendo a perda de um grande amigo. Ou talvez, arrependido de uma ingratidão. Mas parecia confiante no perdão. De um grupo que passa apressadamente, alguém aponta e reconhece: ''Ali vai Simão Pedro. “Estará conosco logo mais.”

Muita gente pelas ruas à procura de notícias. Muita correria entre o Sinédrio e o Pretório. Na boca do povo,' os primeiros comentários faIam da libertação de um criminoso conhecido por Barrabás, posto na prisão por motim e homicídio. No seu lugar fora condenado um tal Jesus de Nazaré, por pretender ser o Rei dos Judeus. Na decisão dos chefes do povo de matá-lo, pesara muito o conselho do sumo sacerdote Caifás: "É melhor que um só homem morra pelo povo."

A gente do povo, em pequenos grupos espalhados pelo pátio do templo, mostrava-se arrependido do que fizera diante do pró-cônsul romano, por instigação dos chefes. À boca pequena, Pilatos era chamado de covarde, medroso, fraco por haver dito lavando as mãos: "Tomai-o e crucificai-o, porque eu não encontro culpa nele."

No caminho do Gólgota, marcas de sangue pelo chão. Não faz nem uma hora que tudo acontecera: "Era já, mais ou menos, 3 horas da tarde quando houve trevas sobre a terra inteira, tendo desaparecido o sol. O véu do santuário rasgou-se ao meio."

Misturado aos curiosos, descendo o Gólgota de volta, vinha um homem cansado, pensativo, passos lentos. E com manchas de sangue nas vestes. Alguém aperta o passo, cruza com ele e fala: "Simão Cirineu, seu gesto calou fundo em muita gente. Eu pensei em fazer o que você fez. Faltou-me coragem."

Próximos do alto do monte, podíamos, agora, ver melhor. De longe, assemelhava-se a um espantalho; de perto, distinguia-se bem o corpo de um homem suspenso numa cruz. Cabeça inclinada e cingida por uma coroa de espinhos.

Rosto ferido das bofetadas e divinamente sereno. Mãos e pés imobilizados por pregos. Coração aberto por uma lança. O corpo inteiro cheio de maus-tratos.

À volta da cruz, pessoas por ele curadas no corpo e na alma manifestavam-se inconformadas com tanta maldade. Repetiam continuamente: "Ele só fez o bem. Só falou de amor e viveu só de amor."

Gente anônima que, momentos antes, em frente ao Pretório vociferava "crucifica-o, crucifica-o", depois de o terem seguido de perto durante a subida do monte, presenciando tudo que ele sofrera, dava sinais de arrependimento.

Alguns hebreus que se detinham diante do crucificado, desfigurado pela dor, confessavam emocionados: "Agora entendemos a resposta que ele dera a Pilatos quando o interrogava sobre sua realeza: Tu o dizes, eu sou rei. Para isto nasci e para isto vim ao mundo, para dar testemunho da verdade. Quem é da verdade escuta a minha voz."

Um grupo de piedosos galileus comentava ao lado: "Aquelas mãos atravessadas com pregos foram estendidas, tantas vezes, para acariciar as crianças, consolar os aflitos, curar os doentes, abençoar; aqueles pés imobilizados não conheceram descanso. Abriram caminhos, desceram vales, subiram montanhas à procura das ovelhas perdidas. E foram seguidos por multidões."

Os soldados que caçoavam dele durante a agonia e umedeceram-lhe os lábios com a esponja embebida de vinagre, com aquele que lhe transpassou o lado com a lança, depois que os olhos se lhes abriram, uniram-se ao centurião para confessar: "Realmente este homem era o Filho de Deus."

"Que fez ele?" - perguntamos nós, peregrinos em Israel, a um doutor da lei misturado à pequena multidão de curiosos. A resposta surgiu prontamente da voz do povo: "Ele falava de amor."

Um nome que estava na boca de toda gente era pronunciado com carinho, admiração e compaixão. Era Maria, esposa de um carpinteiro chamado José. Veio ao encontro do filho no caminho do Gólgota, esteve ao pé da cruz e recebeu nos braços o corpo sem vida nascido de suas entranhas. Foi levada para a casa do discípulo que Jesus amava. Cheia de dor, de amor, de fé.

Assim termina a longa viagem que empreendemos até o limite do mistério, do infinito. De Deus. Até os limites do amor infinito. Terá sido uma viagem inútil? Chegamos tarde demais? Não. Nada foi inútil. Não pode ser inútil o sacrifício do Filho de Deus. Nunca é inútil um mínimo gesto de amor.

Que faremos agora? Fomos testemunhas, fomos personagens, estivemos presentes a este mistério de dor. De indescritível amor. Que faremos agora?

Desce a noite, noite de plenilúnio. Maria, acompanhada por João, volto para casa, foi esconder sua dor. Vamos com ela, vamos esperar a madrugada de domingo. A vitória da vida. O triunfo definitivo do amor. Vamos esperar com ela a ressurreição. Vamos ressuscitar com Ele.

DOM EDUADO KOAIK é bispo emérito de Piracicaba

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