sexta-feira, 1 de abril de 2011

PREITO DE GRATIDÃO AO PE. JOSÉ COMBLIN

O que dizer neste momento do falecimento de Pe. José Comblin?

Conheci este grande guerreiro antes de ver em pessoa. Nos anos de 1962-1966 estudei teologia no seminário diocesano da diocese de Haarlem (Holanda). Foi aí que encontrei um livro dele em holandês "Ik zag een nieuwe hemel en een nieuwe aarde”= (Vi um novo céu e uma nova terra). O livro me fez sonhar da perspectiva de uma nova era que estava para iniciar no tempo do Concílio Vaticano II. Nem de longe tinha consciência que o apóstolo João, querido de Jesus, tinha escrito o livro do apocalipse como carta de consolação às comunidades de cristãos oprimidos e perseguidos. A grande realidade do tempo de João é que a boa nova da grande alegria passa por um vale de lágrimas. "Quem semeia entre lágrimas, recolhe a cantar”.

Empolgado com a perspectiva de uma igreja renovada e a chegada do Reino da Justiça e Paz, fraternidade e partilha, resolvi me oferecer para o serviço da missão. Os caminhos de Deus são misteriosos. Cheguei no Nordeste do Brasil em junho do ano 1970.

Levei um grande susto ao ver e sentir os clamores dos oprimidos que como ovelhas eram abatidas e massacradas. Minha primeira tentação era, após cinco anos conforme o contrato entre os bispos, voltar para minha terra. Senti-me incapaz de enfrentar as inúmeras situações de miséria revoltante, brutalidade e morte sem sentido. Porém fiquei continuando, muitas vezes chorando e não querendo mais ouvir os gritos silenciosos de grandes multidões de pobres que não sabiam para onde ir e o que fazer para se libertarem. Naquela época não queria ser um turista que está aí para passear sem compromisso.

Foi a partir dos anos de 1973 que aos poucos fui conhecer o Pe. José, que dedicava sua vida com inteligência, ciência, fortaleza e teimosia à causa dos marginalizados no campo, plantando a boa semente do Evangelho nos corações dos preferidos de Jesus, como por último plantou ainda uns dias atrás o pé de Pau Brasil para dar sombra à cova de sua sepultura. A imagem me faz lembrar o profeta Jonas, que, após o cumprimento da missão se sentia debaixo de uma árvore para ter sombra e contemplou que sua mensagem aos Ninivitas deu outros resultados que os esperados por ele. Ele ficou frustrado ainda mais quando a sombra que buscava debaixo da árvore desapareceu. A árvore secou.

Sem dúvida vai demorar muito antes que o pau Brasil, plantado por Pe. José vai dar a sombra que está procurando. O pau Brasil cresce muito lento. Também podemos dizer que isso não importa. Paz do cemitério não é a verdadeira paz. A melodia de Luís Gonzaga ressoe na minha cabeça: "Minha vida é andar por este país, para ver se um dia descanso feliz, guardando as recordações das terras onde passei, andando pelos sertões e amigos que lá deixei...

Não sinto dor ou saudade neste momento. Somente gratidão por sua coerência com o Evangelho e a vivência até o último suspiro com o projeto de Deus para com os pequenos desta terra. Rezo e espero que Deus me dê um pouco de sua coragem de perseverar até o fim no cumprimento da missão. Obrigado Pe. José por sua vida e seu exemplo.

Pêsames para você Monica, companheira e servidora fiel que tem dedicado sua vida de serva humilde à causa da evangelização e apoio a Pe. José em todos os momentos. Sem dúvida é você que mais do que qualquer um vai sentir a ausência do nosso guerreiro. Só as palavras do Evangelho ajudam para passar pelo vale de sombras: "Não tenhas medo. Estou com você até os confins do tempo”.

Ao acompanhar, daqui da Holanda, o enterro que está acontecendo por volta deste horário, ouço na minha mente a canção do salmo: "Se Deus nos levar pra casa do nosso exílio, isso será nosso grande sonho”.

Adeus a todos.

Pe. Luís Weel
Sacerdote

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