quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

V FSPA: CARTA DE SANTARÉM

Veja a íntegra da primeira versão do documento final do V FSPA:

Temos uma utopia: A construção de um continente sem fronteiras, a Abya-Yala, terra de muitos povos, iguais em direitos e solidários entre si. Uma terra livre de toda opressão e exploração. A vida em harmonia com a Natureza é condição fundamental para a existência de Abya-Yala. A Terra não nos pertence. Pertencemos a ela. A Natureza é mãe, não tem preço e não pode ser mercantilizada. Compreendemos que Abya-Yala deva ser construída a partir de Estados Plurinacionais que substituam o velho estado centralizador, patriarcal e colonial, dando à luz a novas formas de governo, onde a democracia se exerça de baixo para cima, seguindo a máxima do mandar, obedecendo, onde exista um diálogo de saberes e culturas, onde cada povo seja livre para decidir como quer viver.

A participação plena e igualitária das mulheres é uma condição fundamental na construção das novas sociedades. Da mesma forma a proteção integral das crianças, como portadoras do futuro da Humanidade.

A Terra, nossa casa comum, se encontra ameaçada por uma hecatombe climática sem precedentes na história. O derretimento dos glaciares dos Andes, as secas e inundações na Amazônia são apenas os primeiros sinais de uma catástrofe provocada pelos milhões de toneladas de gases tóxicos lançadas na atmosfera e os danos causados à Natureza pelo grande capital, através da mineração descontrolada, a exploração petrolífera na selva e o agronegócio. Tal situação é agravada pelos mega-projetos, integrantes do IIRSA, como são a construção de hidrelétricas nos rios amazônicos e as grandes rodovias que destroem a vida de povos ancestrais, criando novos bolsões de miséria.

Para deter este ciclo de morte é necessário defendermos nossos territórios exigindo o imediato reconhecimento e homologação das terras indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais bem como o pleno direito de consulta livre e bem informada e consentimento, prévio, preservando assim nossa terra, nosso modo de viver e a nossa cultura, defendendo a Natureza e a vida.

Defendemos e construímos a aliança entre os povos da floresta, dos campos e das cidades. Fazem parte de nosso patrimônio comum a luta dos camponeses pela terra, os direitos dos pequenos agricultores e os justos reclamos por saúde, educação, transporte e habitação dignas e para todos. Lutamos por uma sociedade sem exclusões, com liberdade, justiça e soberania popular. Combatemos no dia-a-dia todas as formas de exploração e discriminação baseadas em gênero, raça, identidade sexual e classe social.

Na Panamazônia, como em toda a América Latina, enfrentamos o militarismo que atua como mediador entre o colonialismo e o imperialismo. Condenamos a utilização das forças militares, corpos policiais, paramilitares e milícias como agentes repressivos das lutas dos povos bem como os intentos de se utilizar a Justiça para criminalizar os movimentos sociais, a pobreza e os povos indígenas. Denunciamos a presença de tropas norte-americanas na Colômbia e a reativação da IV Frota estadunidense como ameaças à paz no continente. Repudiamos o colonialismo Frances na Guiana e apoiamos os esforços de seus povos para alcançarem a independência. Nos manifestamos contra o golpe militar em Honduras e a ocupação militar do Haiti.

Da mesma forma protestamos contra as barreiras que procuram impedir a livre circulação dos povos entre nossos países, defendemos o direito dos migrantes de terem uma vida plena e digna no país que escolherem para morar. Lutamos por construir países apoiados em economias que mantenham a soberania e a segurança alimentar; que desenvolvam alternativas aos modelos predatórios e extrativistas; e que tenham na economia solidária um dos pilares na edificação do bem-estar social.

Para nós os saberes ancestrais são fontes de aprendizagem e ensinamento em igualdade de condições com o chamado conhecimento científico; a democratização dos meios de comunicação uma necessidade inadiável, a liberdade de expressão, a apropriação das novas tecnologias, um direito de todos, bem como uma educação que estimule o diálogo, os contatos sem barreiras, os dons e talentos individuais e coletivos que dissemine valores humanos, abrindo caminho para a transformação íntima e social.

Reafirmamos nossa identidade amazônida através de nossas múltiplas faces, honrando a tradição e construindo o novo. Fazem parte desta identidade as línguas originais dos nossos povos e seus conhecimentos tradicionais. Estes são os nossos compromissos. Devemos transformá-los em ação.

LINHAS DE AÇÃO:

- Lutar pela produção de outras formas de energia, verdadeiramente limpas e renováveis, como a eólica e solar;

- Realizar campanha pelo reconhecimento, demarcação e homologação das terras indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais;

- Lutar pela titulação de terras aos trabalhadores do campo e da cidade;

- Realizar campanhas pela aprovação de leis regulamentando a consulta prévia livre e bem informada e consentimento prévio nos países Pan-Amazônicos;

- Organizar fóruns regionais para troca de conhecimentos e implementação de ações, com organizações de outras regiões, em cada local onde a Mãe Terra esteja sendo agredida, ou ameaçada;

- Participar das redes que investigam a ação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (Brasil), contribuindo para obstruir os financiamentos a projetos que destroem o meio ambiente;

- Promover ações articuladas de denuncia e pressão contra projetos de caráter subimperialista do governo brasileiro na Pan-Amazônia;

- Unificar as lutas contra a construção de hidrelétrica nos rios da Amazônica, em especial as lutas contra Belo Monte, Inambary, Paitzpatango, Tapajós, Teles Pires, Jirau e Santo Antonio;

- Realizar encontros e marchas denunciando as diversas formas de opressão, e apresentando as soluções propostas pelas organizações e movimentos sociais;

- Pensar formas de avançar nos processos de debate e avaliação coletiva, incluindo a elaboração de materiais que possam auxiliar nestes momentos;

- Avançar na elaboração de propostas para garantir vida digna a todos os povos da Pan-Amazônia, considerando suas diferenças intra e inter-regionais;

- Articular a criação do "Dia da Pan-Amazônia", onde todas as organizações realizem manifestações e discussões conjuntas, chamando a atenção mundial para os problemas ambientais, sociais, econômicos, culturais e políticos que ocorrem nesta região;

- Constituir um centro de comunicação do FSPA, de maneira compartilhada e colaborativa, com a função de interligar os movimentos sociais da Pan-Amazônia, socializar debates e iniciativas de ação;

- Divulgar as ações, discussões e resultados do FSPA nas comunidades, através de uma rede de comunicação;

- Construir uma presença marcante da Pan-Amazônia na reunião do FSM em Dakar, no Senegal, em fevereiro de 2011;

- Inserir o FSPA em redes e articulações que tenham causas comuns;

- Realizar o FSPA de dois em dois anos, em países diferentes, com candidaturas antecipadas que deverão ser aprovadas pelas instancias do FSPA.

Santarém 29 de Novembro de 2010.

Várias organizações

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