terça-feira, 19 de outubro de 2010

AS MULHERES DO VATICANO

É inegável. Como há 2.000 anos, hoje, quando chegamos praticamente ao fim da primeira década do século XXI, o Vaticano segue sendo um lugar dominado pelos homens. Contudo, e apesar de que a Igreja continua inamovível em sua decisão de não ordenar mulheres, estas ganham cada vez mais terreno nos trabalhos vaticanos. Em número e importância.

A reportagem é de Irene Savio e publicada no jornal espanhol El Periódico, 17-10-2010. A tradução é do Cepat.

Isto fica muito claro com os dados. Segundo o último censo disponível (2008), trabalham no Vaticano 4.626 empregados nas mais diversas repartições, dos quais 831 são mulheres, quase 18%. Em 2000, havia apenas 593 trabalhadoras, um dado igualmente estratosférico comparado com as poucas dezenas que trabalhavam no Vaticano há 30 anos.

O posto mais alto a que uma mulher chegou no exigente (e masculino) escalão vaticano é a subsecretaria (cargo equivalente a um número três em uma Congregação ou Conselho Pontifício). Há dois casos: Enrica Rossana, de 71 anos, e Flaminia Giovanelli, de 62 anos. Esta última, experta em Economia, conseguiu uma dupla façanha: sendo mulher e não sendo religiosa, é desde janeiro subsecretária do Conselho Pontifício de Justiça e Paz.

Tarefas domésticas

“Sempre houve a presença de religiosas no Vaticano. Em sua maioria, eram encarregadas de tarefas humildes, domésticas, como a portaria, a cozinha ou a limpeza”, explica Lina Petri, empregada do escritório de Comunicação do Vaticano há mais de 25 anos.

Só pouco a pouco também as laicas foram ingressando na cúpula do poder eclesial e agora estão escalando posições. “O aumento da presença e o peso das mulheres obedece a uma estratégia: o papa Bento XVI quer ver mais mulheres no Vaticano”, explica Giovanni Maria Vian, diretor do L’Osservatore Romano a este jornal.

Na redação de Vian é a primeira vez, nos 150 anos de história do jornal do Papa, que é contratada uma mulher: Silvia Guidi. E há quatro anos à frente da Filmoteca vaticana está Claudia di Giovanni. Isso para não citar Barbara Frale, que trabalha no enigmático Arquivo Secreto do Vaticano. Ou Barbara Jatta, responsável pelos Arquivos Gravados na Biblioteca Apostólica Vaticano. Ou Micol Forti, responsável pela seção de arte contemporânea dos Museus do Vaticano. Assim como Eurosia Bertolassi, mão direita do secretário de Estado, Tarcisio Bertone, ou seja, uma dessas eminências pardas de que muito se fala e pouco se sabe.

Mudança de tendência

“A inversão de tendência remonta ao Concílio Vaticano II de 1965, quando a Santa Sé se abriu à presença de mulheres dentro do Vaticano. Mas se avançou muito com Bento XVI e antes, durante os últimos anos de pontificado de João Paulo II (autor de Mulieris Dignitatem, o único documento sobre as mulheres em mais de 2.000 anos de história eclesial)”, explica o vaticanista Ignazio Ingrao.

De qualquer maneira, a situação está muito longe de ser igualitária. A maioria das mulheres empregadas no Vaticano encontra-se entre os níveis 5 e 7 em um plano de carreira de 10 níveis. Some-se a isso que os cargos mais altos dentro do Vaticano estão excluídos deste sistema.

De fato, atualmente não há nenhuma mulher trabalhando como ministra ou vice-ministra ou que esteja à frente, por exemplo, de uma das 9 Congregações, dos 3 Tribunais ou dos 11 Conselhos Pontifícios.

Uma influente exceção é a norte-americana Mary Ann Glendon, professora de Direito em Harvard e atual presidente da Academia Pontifícia para as Ciências Sociais, uma instituição autônoma da Santa Sé, que promove a doutrina social vaticana.

Quem dá a explicação é Ingrao: “A questão é que, no nível jurídico, o acesso a alguns cargos só é permitido aos que são ordenados”. E nisso Bento XVI nada mudou: as mulheres continuam sem poder ser ordenadas sacerdotisas.

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